Crise amplia invasões na região do Rodoanel
SÃO PAULO - O desemprego e a crise econômica têm levado favelas e ocupações irregulares da região do Rodoanel Oeste à expansão. Novos barracos - e até a reconstrução de antigos já derrubados pelo poder público - podem ser vistos desde o início da rodovia, perto das obras do Trecho Norte, até sua ligação com o Trecho Sul.
Os novos moradores são famílias sem ligação com movimentos sociais ou partidos, que vieram, principalmente, das regiões Norte e Nordeste do País. Sem emprego, estão se refugiando no entorno da rodovia.
Logo no início do Rodoanel é possível ver novos barracos surgindo ao redor da comunidade Jardim da Paz, já instalada há 14 anos na região, segundo os moradores. “O Jardim foi se regularizando, recebendo esgoto, luz e asfalto. Com isso, o aluguel foi ficando caro e as famílias estão sendo empurradas. Onde tem espaço a gente constrói”, diz o líder comunitário Natalini Rodrigues da Silva, de 52 anos.
Ele nega ligação com partidos políticos ou movimentos sociais. “Aqui são só pessoas em busca de ter onde viver. Se quiserem nos ajudar, aceitamos. Mas até agora nenhum político nos deu atenção”, disse.
Enquanto a favela resiste, os novos espaços vão sendo ocupados. De um lado, barracos feitos com madeirite e telhas há pelo menos dois anos abrigam cerca de 2 mil famílias. O local é uma extensão do Jardim da Paz e tem sido chamado pelos moradores como Conquista. “A gente monta e a guarda civil tira tudo”, disse Silva.
Do outro, começou a nascer, há dois meses, uma nova ocupação, ainda sem nome. Os terrenos, diz, seriam de uma “fazenda abandonada”. O Estado não conseguiu localizar os donos dos imóveis invadidos.
Os invasores saíram da favela e também de casas alugadas em Perus, na zona norte da capital. “Não sei ler, não tenho estrutura, aí ninguém quer dar emprego”, diz Josefa dos Santos, de 48 anos. Ex-moradora de Perus, ela veio do interior de Alagoas em busca de melhores condições de vida, mas mal conseguia bancar o aluguel com os bicos que fazia na coleta seletiva. E mesmo estes desapareceram, o que a fez deixar o local com dois filhos, de 12 e 15 anos.
“Fiquei sabendo da invasão e vendi o que pude para construir o barraco. Cama, fogão, foi tudo”, diz ela, que gastou cerca de R$ 2 mil para montar toda a estrutura elétrica e erguer a casinha de um só cômodo, ainda de forma irregular.
Conceição Oliveira da Cruz, de 52 anos, chegou no começo da ocupação com sete filhos, o mais novo com apenas 3 anos. Morava no interior da Bahia e era sustentada pelo marido, que morreu. Em São Paulo, tentou viver de favor com uma vizinha por dois anos. “Não deu certo, era muita gente.”
Com apenas 18 anos, Davidson Jesus, de 18 anos, mudou-se com a mulher, de 16, para um barraco no novo local. A menina foi expulsa de casa após o casamento. Antes, dormiam de favor no carro de um amigo. “Descobri que era roubado. Agora que sou maior de idade, preferi não me envolver mais com isso”, disse. Foi aí que descobriu o terreno do Rodoanel. “Fiz um cartão de crédito com R$ 400 de limite e gastei tudo com o material. Fiquei até com o nome sujo, mas foi o jeito.”
Favela. Por toda a extensão do Rodoanel é possível ver outras favelas, muitas delas antigas e já enraizadas. A reportagem conversou com moradores da comunidade Quilômetro 22, como ficou conhecida pelos moradores, no limite com Barueri, na Grande São Paulo.
“Eu cresci aqui, fui embora e agora tive de voltar”, contou Cleiton Gomes da Silva, de 27 anos. Desempregado, precisou deixar a casa no Jaraguá, zona oeste, e construir um barraco no mesmo local onde passara a infância. José Leonardo da Silva, de 24, passava pela mesma situação. Veio com a mulher e arrumou um barraco no local em 2014. “Ameaçam constantemente que vão nos tirar daqui, mas até agora não vieram.”
Prefeitura diz que ‘desfez’ barracos de área pública
A Secretaria Municipal de Habitação informou que uma das áreas invadidas pelos sem-teto na região do Rodoanel Oeste é de propriedade da Prefeitura. De acordo com a administração municipal, a Subprefeitura de Perus fez, no dia 25 de maio, uma operação “de desfazimento de 12 barracos”. “Como o local é uma área de preservação, as moradias eram consideradas irregulares”, disse, por meio de nota.
A secretaria informou ainda que uma outra área ocupada por barracos na região - no km 1 do Rodoanel Oeste - é uma propriedade particular. A ocupação começou, segundo a pasta, nos anos 2000, “como expansão dos assentamentos precários, ao lado do Jardim da Conquista e Recanto dos Humildes”.
Segundo a pasta, a área “não tem ainda nenhuma infraestrutura urbana”. A secretaria informou que prepara “um diagnóstico urbanístico, ambiental e projeto de regularização que, juntos, possibilitarão identificar e quantificar as obras necessárias para a urbanização da área e posterior regularização fundiária”.
A CCR, empresa que administra o Rodoanel, informou, também por meio de nota, que não registra nenhuma ocupação na faixa de domínio administrada.
Já o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, afirma que têm surgido, nos últimos anos, invasões independentes na cidade. “São ocupações espontâneas. Pessoas afetadas pela crise, pelo desemprego e sem vínculo com o movimento social. Nós temos buscado contato com eles e oferecemos ajuda na luta por moradia”, disse
Foto: Felipe Rau, Estadão